..."Há alguns dias, Deus - ou isso que chamamos assim, tão descuidadamente, de Deus -, enviou-me certo presente ambíguo: uma possibilidade de amor. Ou disso que chamamos, também com descuido e alguma pressa, de amor. E você sabe a que me refiro. Antes que pudesse me assustar e, depois do susto, hesitar entre ir ou não ir, querer ou não querer - eu já estava lá dentro. E estar dentro daquilo era bom"...
..."Era isso - aquela outra vida, inesperadamente misturada à minha, olhando a minha vida opaca com os mesmos olhos atentos que eu a olhava: uma pequena epifania. Em seguida vieram o tempo, a distância, a poeira soprando. Mas eu trouxe de lá a memória de qualquer coisa macia que tem me alimentado nestes dias seguintes de ausência e fome. Sobretudo à noite, aos domingos"
Caio Fernando Abreu
Um comentário:
Não há epifanias pequenas,
não medimos epifanias.
Só perguntamos por elas:se as temos, sinal de necessárias.
Se não, sinal de pare.
Se as temos e não tememos:
sinal de fumaça da estação.
Se não as temos, mas queremos:
sinal de trem na linha.
Se as temos e as queremos:
sinal de "breve olá" nessa estação.
Se não as temos e não as queremos:
sinal de minas explodindo na terra de uma guerra.
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